Daniela Antonelli | las equivocaciones se pagan | 22 jan - 09 mar 2019
Daniela Antonelli | Las equivocaciones se pagan | 22 jan - 09 mar
A primeira situação que me chama a atenção nos desenhos de Daniela Antonelli é a sua capacidade de criar uma espécie de filme ou sequência narrativa, no sentido em que o desenho cria uma nova relação com o mundo à medida que ele se conjuga ou se faz como uma forma coletiva. Claro que o desenho, em qualquer circunstância, possui a sua autonomia. E aqui não seria diferente. De todo o modo, suspeito que essa relação – inconsciente, já que não foi planejada pela artista – com o cinema ou o encadeamento de ações não pode ser deixada de lado.
É importante que o espectador compreenda que toda a obra de Antonelli, sejam objetos, desenhos ou pinturas, cria um sistema lúcido, coerente e circular. Em seus desenhos, por exemplo, invariavelmente vemos surgir ao menos uma figura feminina ou masculina envolvida em circunstâncias que compreendem o confronto ou a dialética entre vida e morte, assim como temas que variam entre separação, dúvidas existenciais, amor, solidão, entre outros. O uso de um nanquim aquoso aponta uma visceralidade nesses desenhos. São paisagens translúcidas que deixam à mostra as várias sobreposições de camadas e histórias contidas nas obras, sem adicionar qualquer peso a essa visualidade. São desenhos da ordem da água; fluem pelo papel de forma leve e espontânea. Mas, atenção: não há um excesso de lirismo que desemboca em ver o mundo como algo perfeito. Há uma visão madura e centrada sobre o que é o mundo, com suas oposições, medos, dores, alegrias, desilusões e contrastes.
O corpo é um arquétipo presente nos desenhos e em sua obra como um todo, por meio da presença constante – metafórica ou não – de carne e vísceras. Se, em seus objetos, o corpo e a carne são símbolos presentes, em seus desenhos e pinturas, as vísceras parecem ser um elemento recorrente. Uso a palavra víscera para ilustrar essa suavidade ou fina camada na qual os acontecimentos se sucedem em suas obras bidimensionais. É como se estivéssemos furando com nossos olhos as diversas e delicadas sobreposições que guardam as histórias contidas nessas obras. A própria construção matérica dessas obras, ao criá-las sob um estado de falta de densidade no qual os elementos parecem flanar sem gravidade pelo papel, sugere uma condição de epiderme ou... víscera.
A exposição investiga, portanto, as distintas formas de aparição do corpo e sua relação com o mundo sob um viés, como escrevi nas primeiras linhas, amparado em contradições, incompatibilidades. Contudo, mais do que isso, o corpo não é só tema, mas meio, especialmente em suportes – desenho e pintura – nos quais essa última circunstância nem sempre é uma tônica.
Felipe Scovino