Angelo de Aquino | Destempo | 9 out - 9 nov 2013
Esqueça o Rex por um momento. Ele está dormindo, em sua casinha lá no fundo do quintal. A exposição Angelo de Aquino: Destempo – Obras em papel 1971-1981, que a Mul.ti.plo Espaço Arte inaugura dia 8 de outubro, revive o artista em sua fase mais “intempestiva”. São 32 obras em papel, todas da década de 1970 e início dos anos 80 – um recorte do artista nessa época e há 20 anos escondidas dos olhos públicos. “A obra de Angelo de Aquino precisa ser conhecida em sua totalidade. Estamos mostrando um momento definitivo de sua trajetória”, diz Stella Silva Ramos, sócia de Maria Cristina Magalhães Pinto e Luiz Carlos Nabuco na Mul.ti.plo.
Os trabalhos – todos do acervo pessoal da família – fazem parte de 10 séries: Gardens / Trees / Grass, Through the Amazonas, Intim[ate] works, Trabalhos íntimos, Diário do silêncio, O pensamento abstrato, Das imagens interiores, Impressões da alma, As quatro estações e Imagens. E marcam a fase conceitual da obra do artista. “Aquino não foi o conceitual árido, seco, não era um filósofo. Introduziu um elemento poético, em que a visualidade está muito envolvida com gráficos, palavras, frases, e que propõe uma discussão sobre sua própria identidade”, diz o crítico de arte Frederico Morais.
Alguns trabalhos da mostra foram realizados durante seu período em Milão, de 1970 a 1972, década que também refletiu em sua obra este caráter quase autobiográfico. O que está em jogo é a arte, como via a si mesmo e aos outros: o papel, a função e o ofício do artista. Junto a alguma reflexão sobre o mundo, dentro de um contexto em que o artista está sempre presente. “Ele foi um romântico em busca do conceitual, ou vice-versa”, atesta o galerista Franco Terranova.
A mostra segue o estilo Mul.ti.plo de abordar a arte: nas exposições da galeria, novas facetas, trabalhos ou técnicas inéditas do artista são revelados ao público. “É importante porque é a vontade do galerista que tenta se aproximar de um comportamento mais característico do museu: o do resgate”, afirma Frederico Morais. Coincidentemente – ou não? – a Mul.ti.plo fica em um bairro, e em uma rua, que pontuou toda a vida de Aquino, falecido em 2007. Um mineiro quase por acaso que adotou o Rio aos 7 anos – e especificamente o Leblon como porto da vida inteira. Um de seus ateliês ficava na Rua Dias Ferreira, ao lado do Celeiro; outro na Ataulfo de Paiva, em cima do lendário Luna Bar. Ele podia ser visto caminhando pelo bairro ou comendo ou bebericando no Antiquarius, Jobi, Luna, Galeto. Dizem os amigos que para ir a Ipanema tinha que “elaborar uma programação prévia”. “Começamos nossa amizade no Leblon, à beira da praia, onde nascem amizades eternas e a minha por ele é uma delas. Pouco tempo depois eu o estava colecionando e creio que fui o primeiro a fazê-lo. Consegui reunir na Coleção perto de 50 obras do Angelo”, conta o colecionador Gilberto Chateaubriand.
Angelo de Aquino sempre esteve um passo adiante. Desde a mostra Opinião 65, no MAM do Rio, organizada por Ceres Franco e Jean Boghici, quando foi revelado ao lado de Hélio Oiticica, Antonio Dias, Rubens Gerchman, Carlos Vergara, Roberto Magalhães, entre outros. “Ele sempre subverteu o tempo. Essas obras da exposição mostram isso; há um caráter intempestivo nelas, porque estão sendo apresentadas muito depois de terem sido feitas, fora do contexto em que foram pensadas e criadas. Ao mesmo tempo, são atualíssimas. Ele falou ontem o que se fala hoje. Por exemplo, nas séries Gardens/Trees/Grass e Through the Amazonas, em que já havia nele uma preocupação ecológica”, diz Luiz Eduardo Meira de Vasconcellos, que assina o texto do catálogo, foi amigo próximo e é profundo conhecedor de sua carreira.
A obra de Aquino sempre foi marcada pela inquietude, seja na temática ou na utilização das mais diferentes linguagens contemporâneas, em diversas técnicas como desenho, pintura, arte postal e vídeo. Na mostra da Mul.ti.plo, a inquietação deste artista está mais viva do que nunca.